Dayane Gomes Brandão de Oliveira
Ciro José Callegaro
A internet revolucionou o mercado consumidor e a exposição de produtos e marcas. Se há menos de duas décadas tínhamos as chamadas páginas amarelas, guias com anúncios de diversas empresas dos mais variados ramos, atualmente essa função foi substituída pelos sites e ferramentas de buscas online, que cumprem a função com muito mais eficiência e rapidez.
Quem nunca recorreu aos buscadores do Google, Bing ou Yahoo em busca de um produto ou de uma marca específica? Quem nunca teve o primeiro contato com serviço, produto ou marca através de uma rede social, como o Instagram ou Facebook?
Em vista das constantes evoluções tecnológicas, as ferramentas de busca se tornam mais e mais precisas e úteis, graças a algoritmos que consideram a relevância do termo buscado, sinônimos, geolocalização do usuário, e uma série de outros dados e informações, melhorando em muito a experiência do usuário.
O mesmo avanço tecnológico, contudo, permite o controle de conteúdo, tema para outro debate, e abre margem a novo modelo de negócio, a saber: a publicidade hiper direcionada.
Diante desta oportunidade comercial, o Google, gestor da principal ferramenta de busca, que carrega seu nome, criou o serviço de publicidade “Google Ads” (antigo Google Adwords), que nada mais é do que o pagamento pelos anunciantes para que suas marcas e produtos recebam evidência que se sobrepõe à relevância ditada pelo algoritmo, a depender da utilização pelo usuário em suas pesquisas de palavras-chaves (ou key-words) escolhidas pelo anunciante.
As pesquisas que contemplam termos patrocinados retornam para o usuário, a indicação do site ou web page da empresa que contratou o serviço da gigante do Vale do Silício no topo da página de resultados (Search Engine Results Page), e acima do que seria a resposta orgânica, juntamente com modesta indicação de se tratar de “link patrocinado”, prática que pode ser entendida como em violação ao dever de informação.
A grande vantagem para quem anuncia é que a ferramenta gera tráfego qualificado e segmentado para o site do contratante da ferramenta, atraindo potenciais consumidores já engajados na busca por determinado produto ou serviço, e iniciados no processo de decisão pela sua aquisição, sendo indiscutível a importância da ferramenta na estratégia de marketing digital para empresas que pretendem se destacar no mercado.
Por seu turno, comumente empresas tem associado aos seus anúncios, nomes comerciais e marcas registradas de empresas concorrentes como palavras-chaves para a pesquisa, prática de questionável licitude, e que tem levantado questões sobre a configuração de concorrência desleal, conduta vedada em nosso ordenamento jurídico (art. 195, incisos III, IV e V da Lei de Propriedade Intelectual).
I – Do Comportamento em Pesquisa – Impacto no Processo de Convencimento
As ferramentas de busca permitem todo tipo de pesquisa, e assim integram o processo de convencimento do usuário tanto para que este forme seu convencimento da necessidade ou vontade de contratação de determinado produto ou serviço, como para que este opte pela Marca A ou B, e, dentro da marca escolhida, pelo Produto/Serviço X ou Y.
As palavras utilizadas pelo usuário como termos de pesquisa são comparadas com o conteúdo dos sítios eletrônicos indexados à plataforma de busca e seu conteúdo, e determinam a relevância dos termos de pesquisa e dos seus resultados, em associação a outros critérios que são utilizados pelos algoritmos do Google, como distância e posição de destaque[1].
Assim, a expectativa do usuário é de que o resultado orgânico (o retorno dos resultados das pesquisas) corresponderá à efetiva relevância do tema pesquisado, e não se pode perder de vista que a relação entre o usuário e a plataforma de pesquisa é de consumo, logo, é de rigor que a ferramenta seja transparente quanto ao funcionamento de seu algoritmo, respeitado o segredo industrial, o que permite concluir que os critérios de relevância não podem se distanciar daqueles assim entendidos pelo homem médio.
Estes passos (pesquisas por marcas ou produtos) antecedem a manifestação de vontade (art. 104, do Código Civil) que, no mercado de consumo, usualmente se concretiza pela adesão a uma oferta pública (artigos 429, do Código Civil, 30 e seguintes, do CDC), ainda que passível de ajustes e negociação.
Ao se analisar o comportamento de quem se vale das ferramentas de pesquisa, é possível segmentar tais usuários em dois grupos distintos, o primeiro que busca genericamente por um produto ou serviço, portanto alguém que ainda não firmou convicção pela marca com quem deseja contratar, e muitas vezes sequer se deseja contratar; e o segundo que busca por produto ou marca específico, o que indica já ter superado as fases de convencimento pela necessidade ou vontade de contratar aquele produto ou serviço, e de criação de vínculo (de confiança, credibilidade, etc.) com a marca pesquisada, estando mais próximo de contratá-la.
Ao pesquisar por determinada marca, o usuário objetiva, essencialmente, ter acesso a informações sobre aquele prestador de serviço ou fornecedor de produto, como seus dados para contato, visualizar avaliações de outros consumidores sobre o produto ou o serviço, conhecer mais sobre a marca, ou até mesmo conhecer os preços praticados, visando futura contratação.
É possível intuir, neste caso, que a probabilidade de um usuário que pesquisa o exato termo de uma marca e com ela contratar é maior do que a probabilidade de a busca genérica sobre um produto ou serviço pelo critério de sua natureza resultar em um negócio.
II – A Utilização de Marcas de Terceiros em Anúncios Patrocinados – Concorrência Desleal
Os titulares de marca envidam muitos esforços para que estas se tornem conhecidas, mediante esforços de publicidade e demonstração de credibilidade, usualmente resultados de vultosos investimentos, elemento que orienta e fundamenta a sua proteção legislativa.
Dentre as práticas utilizadas por titulares de marcas e/ou fornecedores de produtos e serviços menos conhecidos no mercado, visando impulsioná-los (até como forma de presença em mercado), figuram: (i) a exploração da publicidade comparativa (regulamentada pelo art. 32 do Código de Autorregulamentação Publicitária), (ii) o patrocínio de conteúdo de terceiros que promove a comparação de marcas e produtos, sem fins lucrativos diretos, e (iii) a contratação, como termos de pesquisa (key words), de nome de produto ou marca de terceiro, de maior notoriedade.
Ao mencionar expressamente a marca do concorrente como conteúdo, no âmbito da publicidade comparativa no sítio próprio, ou de terceiro, o titular do domínio atrai para si parte da relevância atribuída ao seu concorrente (no que tange ao resultado de pesquisas), prática que pode ser questionada, nos termos dos arts. 132, IV, da Lei de Propriedade Intelectual, 18 e 52, do Código Civil, ainda que aquele que publica a matéria possa alegar que colabora com a mais ampla informação, princípio que estaria em consonância com o disposto no artigo 6º, inciso III, CDC.
Já a contratação do nome da marca ou do produto como palavra-chave para pesquisa, retornando a marca, produtos ou serviços de pessoa jurídica concorrente, em detrimento dos resultados orgânicos e primários que apareceriam na plataforma, claramente configura a concorrência desleal, e implica em nítida violação ao disposto no artigo 195, incisos III, IV e V da Lei de Propriedade Industrial.
Isso porque além de violar o direito marcário, a prática implica em entregar ao grupo de usuários e potenciais consumidores que buscaram essencialmente pela marca violada, informações de empresa concorrente, e não por relevância, mas sim em marketing direcionado e predatório, o que, indiscutivelmente, tem potencial de gerar confusão ao usuário (consumidor), levando-o a clicar em anúncios de concorrente, redirecionar o tráfego orgânico e até mesmo causar confusão de marcas ou prejudicar a reputação da marca original.
Destarte, a marca, o sinal próprio, somente poderia ser atrelada como termo de pesquisa (key-words) pelo próprio titular.
Neste contexto, considerando a previsão legislativa de proteção do nome e da marca, e os preceitos que regem a relação de consumo, entendemos pela ilicitude tanto da contratação, como palavra-chave, de marca ou símbolo de titularidade de outrem, como a não exibição de resultado orgânico por relevância (isto é, apresentação como primeira opção do sítio eletrônico / serviços / produtos do titular da marca) quando a pesquisa contemplar termo protegido pela propriedade intelectual, industrial, ou nome próprio.
III – Repercussões Jurídicas do uso de marcas de terceiros para promoção de anúncios
O poder judiciário tem compreendido como ato de concorrência desleal, quando:
“i) a ferramenta Google Ads é utilizada para compra de palavra-chave correspondente a marca registrada ou a nome empresarial; ii) o titular da marca ou do nome e o adquirente da palavra-chave atuam no mesmo ramo de negócio e iii) o uso da palavra-chave é suscetível de violar as funções identificadora e de investimento da marca e do nome empresarial adquiridos como palavra-chave.”[2]
No contexto legal, a Lei de Propriedade Intelectual desempenha um papel fundamental na proteção de marcas registradas e na resolução de disputas relacionadas à concorrência desleal. O artigo 195 da referida Lei reprime o uso parasitário dos sinais distintivos de marca registrada de forma que possa causar confusão aos consumidores, ou associação indevida entre a empresa que usurpou o direito marcário e a empresa titular da marca, como é o caso da utilização de links patrocinados na intenção de desviar clientela.
Sob outro prisma, a proteção ao nome empresarial e à marca registrada, visa também proteger o consumidor de enganar-se quanto ao produto e fornecedor, visto que a marca constitui sinal distintivo entre os produtos ou serviços oferecidos por uma empresa e aqueles oferecidos por outra empresa[3].
Consoante isso, nas palavras do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, no julgamento do supramencionado Recurso Especial nº 2.032.932:
“O consumidor, ao utilizar como palavra-chave um nome empresarial ou marca, indica que tem preferência por ela ou, ao menos, tem essa referência na memória, o que decorre dos investimentos feitos pelo titular na qualidade do produto e/ou serviço e na divulgação e fixação do nome.
Trata-se, portanto, de escolha do consumidor que pode decorrer de sua anterior experiência com aquele produto, da indicação de utilização por outrem, do marketing realizado pelo empresário, do prestígio da marca, da qualidade do serviço, da solidez do nome empresarial, todas situações por trás das quais está o esforço do empresário.[4]”
Por sua vez, configurada a concorrência desleal, isso poderá implicar ao causador do dano, ou seja, para o anunciante que indevidamente utilizou a marca do concorrente como termo de palavra-chave, o dever de reparação pelos prejuízos financeiros, entendidos como lucros cessantes, isto é, o que o legítimo detentor da marca deixou de receber ou lucrar, durante o período de violação do direito marcário, conforme estabelece os artigos 209 e 210 da LPI.
Com relação aos danos morais, há firme entendimento jurisprudencial que são presumidos (ou in re ipsa), em outros termos, significa dizer que havendo a violação, os danos morais não necessitariam de comprovação, ele simplesmente existe pela prática do ilícito.
A responsabilidade civil do agente causador do dano, decorre do abuso do direito de concorrer[5], podendo prescindir a configuração de dolo ou culpa. A Constituição Federal funda a liberdade de concorrência no art. 170, inciso IV, consistente na possibilidade de qualquer pessoa explorar atividade econômica, sem inviabilizar o exercício dos demais. Desta forma, revela verdadeiro abuso de direito, a intenção de se promover no mercado consumidor, a exploração de marca alheia por quem não a detém, como resta caracterizado no caso objeto de análise.
E se de um lado é evidente a responsabilidade do anunciante, merece discussão também a responsabilidade da plataforma, dado que disponibiliza ferramenta que permite tal distorção.
Nesta seara, em que o consumidor é o destinatário tanto do produto e serviço, como da propaganda, o Google em diversas ações pesquisadas em que figurou como Réu, se defendeu alegando retratar-se mera publicidade comparativa entre marcas, prática reconhecida para o estabelecimento de um mercado consumidor competitivo e saudável, além de prevista no Código Brasileiro de Autorregulamentação da Publicidade.
Todavia, superando-se o fato de que na prática os sítios eletrônicos que se valeram do expediente questionado não atenderam aos preceitos da publicidade comparativa, o ato de utilizar a marca da empresa concorrente como palavra-chave: (i) configura proveito injustificado do prestígio da marca alheia, (ii) tem potencial de gerar confusão entre os consumidores, visto que ao digitarem no campo de busca o nome determinada empresa visualizarem como primeiro resultado link patrocinado de empresa concorrente, e (iii) caracteriza ato de concorrência desleal, nos termos do art. 195, incisos III, IV e V.
Nestes termos, recentes decisões sobre o tema têm apontado que quando o usuário busca pelo termo exato de determinada marca, deve prevalecer o resultado orgânico, o que não impede que outras opções também sejam expostas na página de resultados, desde que não tenha sido violado o direito marcário. Este é o entendimento esposado no acórdão que julgou o emblemático caso das renomadas empresas de lingerie, HOPE e Loungerie, em que a segunda utilizou o nome da primeira para se destacar:
“Os resultados de pesquisa apresentados na busca orgânica devem continuar apresentando os conteúdos de acordo com a sua relevância. Assim, a vedação à compra de palavra-chave referente à marca do concorrente não obsta que apareçam outras opções de produtos e serviços no resultado de pesquisa, ficando inalterados o fluxo de informações, a liberdade de expressão e a livre concorrência. O que se busca combater a manipulação do consumidor por meio de uma publicidade em que o anunciante paga para propositalmente estar em destaque quando o consumidor busca uma marca concorrente.”[6]
Como bem elucidado no voto proferido pela Ministra Nancy Andrighi, a vedação de compra de palavra-chave com o termo de marca registrada não caracteriza censura e não encontra óbices às garantias de liberdade de expressão e livre concorrência, conquanto, em verdade, se objetiva proteger o direito do consumidor e do titular da marca.
O Doutor em direito, Edson Beas Rodrigues Jr., esclarece que no mundo virtual existem limites à liberdade de expressão, prevalecendo também às boas práticas de mercado e as normas regulatórias de propaganda, valendo o judiciário intervir para impedir o contrário:
“Não há dúvidas de que a Internet é um espaço por excelência da liberdade. Contudo, esta liberdade não é irrestrita. Tampouco a Internet é terra de ninguém, sujeita à grilagem virtual (cybersquatting). Nem tudo o que é localizável no mundo virtual está sujeito à apropriação e privatização. No caso da atuação dos serviços de links patrocinados e de seus clientes, que se utilizam indebitamente das marcas de terceiros para se enriquecerem injustamente, tem-se um caso de ‘homo homini lupus’, e não de solidariedade. A famosa frase atribuída a Isaac Newton (‘Se pude ver mais longe, foi por estar sobre os ombros de gigantes’) reflete como os clientes dos serviços de links patrocinados se beneficiam deste mecanismo de marketing: colocam-se sobre os ombros dos gigantes da Internet para se sobreporem deslealmente aos seus pares. É neste ponto que cabe ao direito intervir, criando balizas para impedir que a liberdade seja abusivamente exercida pelos titãs do mercado, criando desequilíbrios tão prejudiciais aos agentes econômicos e ao consumidor.”[7]
Portanto, não restam dúvidas acerca da ilegalidade da utilização como key words de marca de terceiro, ato que caracteriza concorrência desleal.
IV – Da Responsabilidade da Plataforma – Dever de Não Violação ao Direito Marcário
Num último aspecto importante de ser abordado, merece destacar que o dever de abstenção (de utilização de marca de terceiro como key word) se estende ao responsável pela ferramenta de busca, especialmente no caso de prestação de serviços remunerados de direcionamento de resultados de pesquisa.
Cumpre à plataforma (i) prever em seus termos de uso a vedação à utilização de nome próprio / marca de terceiro como key word, (ii) confrontar os key words contratados com dicionários, e com o seu repositório de sítios eletrônicos indexados, (iii) inserir no contrato declaração específica de que os key words contratados não violam direito de terceiro, (iv) disponibilizar canal de denúncia eficiente, associado a protocolo de pronto atendimento no caso de denúncias de violação ao direito marcário, e outras medidas associadas ao tema.
No atual estágio da tecnologia, as plataformas possuem plenas condições de identificar se o anunciante está contratando key words que violem os termos de uso e serviço, e, inclusive, de formalizar parceria com o INPI para pesquisas robotizadas.
Recentemente o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo acolhendo tese patrocinada pelo Escritório Falletti Advogados, reformou sentença que havia deixado de condenar a plataforma, por, supostamente, o Google se encaixar no conceito de provedor de Internet, o que afastaria sua responsabilidade por dano ocasionado por terceiro, a teor do disposto no artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14)[8].
No recurso de Apelação apresentado, a tese central se firmou no sentido que (i) os serviços Google ads não se enquadra no típico conceito de provedor de internet, (ii) a plataforma aufere lucros com o anúncio violador e, (iii) a partir da cientificação extrajudicial que determinado anúncio viola a Lei de Propriedade Industrial, o anúncio deve ser retirado do ar pela plataforma, ou incorrerá em crime de concorrência desleal por culpa in vigilando.
O Acórdão ao analisar a responsabilidade do Google, em aderência aos elementos acima especificados sintetiza bem o quanto exposto neste artigo, sendo brilhantemente fundamentado pelo Desembargador Relator Maurício Pessoa da seguinte maneira:
“Diferentemente dos provedores de domínios, que são meras plataformas de veiculação de conteúdos selecionados pelos próprios internautas e somente são responsabilizados civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial, não tomarem as providências para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, a prestação de serviço AdWords é relação contratual onerosa que não imuniza o Google sobre os efeitos que ela gera na esfera jurídica de terceiros e, por isso, não se subsumi ao artigo 19 da Lei nº 12.965/2014, cuja ratio do caput é a de “assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”; não é a de imunizar a prestação de serviços, constitutivo de concorrência desleal, pelos prejuízos que ela causa. (…)
Ressalta-se, ainda, que o caso em exame revela que a ré Google concorreu para a prática do ilícito, o que a torna solidariamente responsável pela reparação com fundamento no artigo 942 do Código Civil, até porque a sua atuação, constitutiva que é de concorrência desleal, em nada se compara à publicidade comparativa, essa, sim, lícita por beneficiar o consumidor, fortalecer a concorrência saudável no mercado e estar fundamentada nos princípios da livre concorrência e da livre iniciativa (CF, art. 1º, IV).”[9]
Verifica-se uma tendência das Cortes estaduais e em alguns recentes precedentes do STJ, em reconhecer a responsabilidade do Google, enquanto parceiro contratual do anunciante, o que é indicativo que a ferramenta deve se adequar às normas brasileiras de concorrência desleal, inclusive, porque já possui algoritmos capazes de reconhecer estabelecimentos em mapas, bem como, aceita contribuições de usuários em formato de avaliações, registra URLS de empresas, até mesmo com o aceite de cookies junto aos provedores de internet.
Assim, considerando que as gigantes da internet já possuem (ou reúnem condições para possuir) mecanismos de fazer o reconhecimento de marcas registradas, parece razoável compreender que as obrigações inerentes do mercado competidor se estendam a elas, que deverão se adequar na prevenção de atos de concorrência desleal.
V- Considerações Finais:
Pelo exposto, pode-se concluir que o uso de marca alheia como palavra-chave configura concorrência desleal, conquanto o anúncio violador empresta-se do nome e prestígio do concorrente para atrair atenção de potenciais consumidores em posição de destaque no site de pesquisas, colocando o titular da marca em posição desprestigiada na página de resultados, o que viola os direitos de propriedade industrial, acarretando, também, violação ao direito do consumidor.
Ao que parece, a matéria tem se pacificado nos Tribunais pátrios, o representa desafios ao Google e outros agentes de tecnologia que se valham de recursos semelhantes, que deverá(ão) adequar suas plataformas de publicidade, de modo a reconhecer quando um anúncio utiliza marca registrada alheia indevidamente, com potencial a lesar o seu titular e consumidores.
No mais, num mercado cada vez mais competitivo, as empresas necessitam firmar sua presença no mundo online com as ferramentas disponíveis de marketing digital, o que inclui o serviço de Ads, todavia, é essencial que as práticas neste universo sejam éticas e busquem manter a integridade do mercado. E, sendo o caso de ofensa ao direito concorrencial, o judiciário preste a tutela aplicável ao ofendido, independentemente, se a violação ocorreu virtualmente, ou não, claramente, com ressalvas ao princípio constitucional da livre concorrência.
[1] Segundo a ferramenta, a classificação local dos resultados de busca, utiliza-se de critérios como relevância, distância e destaque. Extraído de: https://support.google.com/business/answer/7091?hl=pt-BR#:~:text=Como%20o%20Google%20determina%20a,melhor%20correspond%C3%AAncia%20para%20sua%20pesquisa. Acesso em: 30/10/2023.
[2] Recurso Especial nº 2.032.932 – SP; Terceira Turma; Ministro Relator: Ricardo Villas Bôas Cueva; Julgado em 08/08/2023.
[3] Neste sentido, a Política Nacional das Relações de Consumo também coíbe práticas de concorrência desleal, que possam ocasionar confusão entre consumidores, uma vez que estes são destinatários finais de produtos e serviços, conforme prescreve o art. 4º , inciso VI do CDC: Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: VI – coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores
[4] Recurso Especial nº 2.032.932 – SP; Terceira Turma; Ministro Relator: Ricardo Villas Bôas Cueva; Julgado em 08/08/2023.
[5] Assim dispõe o Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
[6] Recurso Especial nº 2.012.895 – – SP; Terceira Turma; Ministra Relatora: Nancy Andrighi; Julgado em 08/08/2023.
[7] RODRIGUES JÚNIOR, Edson Beas. Reprimindo a concorrência desleal no comércio eletrônico: links patrocinados, estratégias desleais de marketing, motores de busca na internet e violação aos direitos de marca. Revista dos Tribunais. São Paulo, n. 961, nov. 2015. Disponível em: <http:/ https://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RTrib_n.961.03.PDF >. Acesso em: 18.10.2023.
[8] Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.
[9] TJSP – Apelação Cível nº 1048656-64.2020.8.26.0100; 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Relator: Desembargador Maurício Pessoa; Julgamento em 09/05/2023.